quarta-feira, 16 de junho de 2010

REFLEXO 1.9

                                      Renoir - Mulher com gato

CONFISSÕES DE AMOR

Te amo porque te amo.
É simplesmente assim.
Posso buscar motivos,
Explicações, enfim,
Mas só há (e eu proclamo!)
Tu e eu definitivos.

Te quero porque quero
Tudo que és. Porque sou,
Sem ti, a sombra vaga
Que jamais encontrou,
Da luz que se propaga
E a mantém, o astro certo.

Eu te quero porque sim,
Porque me sinto bem
Em te amar, como sinto
Um quê, que vai além
Das palavras, de mim...
E nos une, distinto.

Com tudo que em mim há,
Te amo. Embora não caiba
Hoje ao amor uma voz
Pregando-o eterno, saiba:
Meu amor durará
O mesmo, então, que nós.

terça-feira, 25 de maio de 2010

REFLEXO 1.8

                   Dominique Ingres - La grande Bigneuse-1808

AMOR DE INSTANTES

Quando ao teu lado penso no que sinto,
E renego a certeza do que vejo.
Se não te enxergo, tenho só desejo
E o ímpeto de todo o meu instinto.

Quando longe te busco, e então faminto
Sorvo o teu corpo na fúria do pejo
Que se espedaça; no calor do ensejo
Tudo surge, resiste e fica extinto.

Nesse amor de uns encontros, de uns instantes,
Não há noções. E o que há logo se esvai.
Somos, nessa hora, amados, mais que amantes.

Essa é a nossa maior paixão; pequena
Vive, e se nutre quando nem acena
O primeiro que enfim se veste e sai.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

REFLEXO 1.7

                               Gustav Klimt - A floresta- 1901

DUALIDADE SENTIMENTAL

Se houvesse palavras de amor
No limite da boca,
Forças, sensações, felicidade, futuro,
Fariam menos falta.
Mas o que se tem não se controla.
Só se tem as impressões e os olhos,
E eles se concentram nos espaços em volta.
Imóveis objetos alheios,
O despertencimento de tudo que circunda,
E o desejo se extinguindo.

A tristeza se faz descrente de paz,
Ou se acha incapaz de não ser.
Mais triste é a boca amando sem palavras,
Errante como uma tonta ou louca,
Soltando termos desconexos, estranhos, delirantes.
Os sentimentos, o amor, solitários,
São, ao mesmo tempo, um espetáculo e um hospital,
Que a consciência assiste e não assiste.

quarta-feira, 31 de março de 2010

REFLEXO 1.6

James Ensor - A senhora triste (1881)


ÀS VEZES...


Às vezes penso em teu sorriso e me contentento.
Às vezes penso até que posso, que mereço.
Sofro todas as vezes que um só cumprimento
É o que temos nas vezes de mostrar apreço.

As vezes ao teu lado são de sofrimento,
Pelas vezes que não tivemos, pelo preço
Que, às vezes, se tem que pagar por um intento.
Às vezes o desfecho está é no começo.

Às vezes o amor é complexo e conturbado.
Às vezes o amor pode ser logo e tranqüilo.
Ninguém se informa de tudo isso antecipado.

Às vezes não importa se é tolo ou esperto.
Às vezes só se pode amar triste e em sigilo.
E, às vezes, dar adeus a quem nem está perto.

sexta-feira, 12 de março de 2010

REFLEXO 1.5

Gerhard Richter - Betty-1988


PEQUENA REFLEXÃO

Ela é linda.
E, porque linda,
Eu a quero.
E, porque a quero,
Eu não a tenho.
E, porque não a tenho,
Eu a quero.
E, porque eu a quero,
Ela é linda.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

REFLEXO 1.4

(Caspar Friedrich - O viajante sobre o mar de névoa -1818)


SUPONDO

E se eu dissesse que, como a ninguém, eu te amo?!
E te explicasse o grande sentido da vida?!
E te afirmasse que serias mais ouvida?!
E se eu te dissesse como de fato me chamo?!

Eu juraria não haver dores nem medos,
Se eu pudesse jurar. Não compraria flores.
Se eu pudesse falar ou findar os segredos,
Quem sabe se extinguissem os medos e as dores.

E se eu sofresse em todo o momento em que sofres?!
E se eu mais me esforçasse em servir-te, agradar-te...?!
E se eu te revelasse como abrir os meus cofres?!

E se eu te dissesse algo que nunca te disse?!
E provasse que penso em ti em toda parte?!
E que vivo supondo sobre ti?! E se...?!

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

REFLEXO 1.3

 (Carel Willink - Simeão, o Estilita-1939 )

O ESTILITA*

*Anacoreta (religioso solitário) que vivia sobre pórticos e colunas em ruína

O que ele tinha para te dizer
Não estava em seus olhos,
Não estava em sua boca
Prestes a sair.
Estava na sua alma,
Bem dentro, se sentindo
Existir em seu desconhecimento.

E o que ele tinha para te dizer
Não pode ser dito.
Para sabê-lo terias que descobri-lo.
Mas como poderias
Ver a alma dele
E o que nela havia?

Ele acreditava que podias vê-la
Pois, ao que parece, ele via a tua.
(Mas não vistes. Não era para veres?)
O problema estava com ele
E não no que ele tinha para te falar.
O problema era maior do que ele acreditava.
O que ele não conseguia dizer
Começava com a declaração
De que tinha algo a te dizer.

Ele que tinha praticamente tudo
Para tentar se expressar.
Tinha as palavras, tinha a arte, tinha a tua atenção.
Mas algo lhe faltava.
No alto da coluna ele não encontrou,
Não entendeu, não desvendou.
Agora está lá, não consegue descer,
Como um dia não conseguiu te falar.
E ele ficará, só, triste, absorto,
Como não conseguiu ficar contigo.