terça-feira, 25 de maio de 2010

REFLEXO 1.8

                   Dominique Ingres - La grande Bigneuse-1808

AMOR DE INSTANTES

Quando ao teu lado penso no que sinto,
E renego a certeza do que vejo.
Se não te enxergo, tenho só desejo
E o ímpeto de todo o meu instinto.

Quando longe te busco, e então faminto
Sorvo o teu corpo na fúria do pejo
Que se espedaça; no calor do ensejo
Tudo surge, resiste e fica extinto.

Nesse amor de uns encontros, de uns instantes,
Não há noções. E o que há logo se esvai.
Somos, nessa hora, amados, mais que amantes.

Essa é a nossa maior paixão; pequena
Vive, e se nutre quando nem acena
O primeiro que enfim se veste e sai.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

REFLEXO 1.7

                               Gustav Klimt - A floresta- 1901

DUALIDADE SENTIMENTAL

Se houvesse palavras de amor
No limite da boca,
Forças, sensações, felicidade, futuro,
Fariam menos falta.
Mas o que se tem não se controla.
Só se tem as impressões e os olhos,
E eles se concentram nos espaços em volta.
Imóveis objetos alheios,
O despertencimento de tudo que circunda,
E o desejo se extinguindo.

A tristeza se faz descrente de paz,
Ou se acha incapaz de não ser.
Mais triste é a boca amando sem palavras,
Errante como uma tonta ou louca,
Soltando termos desconexos, estranhos, delirantes.
Os sentimentos, o amor, solitários,
São, ao mesmo tempo, um espetáculo e um hospital,
Que a consciência assiste e não assiste.